Cultura inútil | Diz o dito popular… Para que servem os ditados? 

Imagem: WikiCommons.

Por Mouzar Benedito

Recentemente, ao ver a atitude de um sujeito mau-caráter, que sacaneou pessoas que o ajudaram, eu me lembrei de um ditado que ouvia quando era criança: “A barriga não dói uma vez só.” Quer dizer, o safado sempre pode precisar de ajuda de novo, e aí suas vítimas o mandarão… plantar favas (ia pôr um palavrão aqui).  

Ditados populares são expressões que transmitem sabedoria e experiências de geração em geração. Em determinadas situações, em vez de xingar, reclamar ou dar um palpite qualquer, fala-se um ditado que faz os outros pensarem. Provérbio é a mesma coisa, só que geralmente mais poético. Costuma-se diferenciar também considerando que o ditado é mais regional, enquanto um provérbio seria mais universal, podendo ser traduzido para outras línguas. No fundo, é tudo a mesma coisa, incluindo outros sinônimos como adágio, anexim, axioma, máxima, rifão, princípio…  

O humorista Barão de Itararé usava muitos e criava frases que, pode-se dizer, viraram ditados. Chamava-as de “máximas”, mas brincava com isso no livrinho Máximas e mínimas do Barão de Itararé. Algumas das suas sentenças ficaram famosas, como estas: “O fígado faz muito mal à bebida”; “Tempo é dinheiro, então paguemos nossas dívidas com o tempo”; “Devo tanto que se chamar alguém de meu bem o banco toma”; “O homem é um animal que pensa, a mulher é um animal que pensa o contrário”. Uma que gosto é: “As pessoas de bem costumam falar mal dos vagabundos. Mas não é por mal, é inveja.”

Venho de uma cidade pequena de Minas Gerais, e lá usava-se muito os ditados. A maior parte deles, conhecidos por todo lado, como estes:

“Quem se abaixa demais, a bunda aparece.”

“Em festa de jacu, nhambu não pia.”

“Quem trai uma vez, trai duas ou três.”

Mas também tinha alguns locais ou regionais. Por exemplo, tem um caipira mineiro: “É junto com os bão que a gente fica mió.” E tem uns locais, acho que exclusivos da minha terra, como este da sua zona rural, “mió do que uma muié, só duas muié; mió do que duas muié, só duas muié”, e este urbano, “mais vale um gosto do que um caminhão de abóboras”.  

Há ditados que não são muito realistas… Até este, que Lula usou no início da guerra da Rússia contra a Ucrânia: “Quando um não quer, dois não brigam.” Ora, o que quer brigar, se o outro não quer, enche-lhe de porradas, azar do não brigão. Inimizade não depende de comum acordo, amizade sim, então adaptei para “quando um não quer, dois não são amigos”. 

Uns não podem mais ser usados, por serem “politicamente incorretos”. Exemplo: “Baixinho só serve pra arrumar briga pra gente grande.”

Enfim, esse hábito cultural, de transmitir conhecimentos, sabedoria e regras de comportamento, me parece universal. Em uns livros que tenho, há ditados de vários países, e andei vendo outros por aí. Acho que a China é o país mais pródigo em provérbios, daria para encher muitas páginas com eles. Mas Japão, Turquia, Espanha etc. também têm muitos. E há alguns de origem religiosa… Resolvi publicar um pouco aqui, resumido em quantidade de cada povo. Pensava em colocar só um de cada, mas são tantos que às vezes estendi para até três (poderiam ser muitos mais), mas com variedade enorme de povos de origem. Alguns são comuns a vários países, então pode ser que vários que listo aqui possam ser encontrados indicando outras origens.  Não vou falar da situação em que devem ser usados, fica por conta do leitor imaginar.


Egípcio: “Antes de questionar o bom senso de sua esposa, dê uma olhada em com quem ela se casou”. 

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Egípcio: “Por maior que seja, todo deserto sempre se acaba”. 

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Mongol: “O vitorioso tem muitos amigos; o vencido tem bons amigos”. 

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 Escocês: “Melhor um foguinho pra te esquentar do que um fogaréu pra te queimar”. 

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Escocês: “Prazer e perigo andam de mãos dadas”. 

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Argelino: “O Messias curou os cegos e os leprosos, mas nunca os tolos”. 

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Argelino: “Quando penso nas desgraças dos outros, esqueço as minhas”. 

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Vietnamita: “Quando estiver comendo a fruta, pense na pessoa que plantou a árvore”. 

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Brasileiro: “Passarinho que acompanha morcego acorda de cabeça pra baixo”. 

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Espanhol: “O que hoje te compra com sua adulação amanhã te venderá com sua traição”. 

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Espanhol: “Não há feio sem sua graça nem galã sem seu defeito”. 

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Dinamarquês: “Não existe mau tempo, apenas roupas inadequadas”. 

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Turco: “O zurro de um jumento é uma declaração de amor para uma jumenta”. 

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Turco: “Quando um come e outro apenas o vê comer, nasce a revolta”. 

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Turco: “Para o louco, todo dia é de celebração”. 

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Italiano: “Toda festa tem seus malucos”. 

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Francês: “Ricos e loucos fazem o que querem”. 

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Francês: “Sempre há cachorros demais em torno de um osso”. 

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Chinês: “A única porta bem fechada é a que se pode deixar aberta”. 

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Chinês: “A sabedoria consiste em não subir muito alto nem descer até muito baixo”. 

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Chinês: “Os sábios aprendem com os erros dos outros, os tolos com os próprios erros e os idiotas não aprendem nunca”. 

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Japonês: “A rã, no seu charco, zomba do oceano”. 

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Japonês: “O fruto de cem dias de conferências pode ser destruído pelo som de um peido”. 

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Japonês: “Somente amanhã soprará o vento de amanhã”. 

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Malgaxe: “Ser rico e passar privações não é ser rico, é ser guarda de tesouros”.

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Persa: “Quem está se afogando não se preocupa com a chuva”. 

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Persa: “A gazela sedenta não ouve senão o chamado da água”.

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Persa: “Um ladrão é um rei, até ser apanhado”. 

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Não se dei onde: “Definir um ladrão para pegar um ladrão”. 

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Etíope: “Quando o rato ri do gato, há um buraco perto”. 

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Etíope: “O machado esquece; a árvore recorda”. 

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Ugandense: “O macaco que vai atrás ri do rabo do que vai à frente”. 

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Coreano: “Palavras não possuem asas, mas podem voar milhares de milhas”. 

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Coreano: “Há sempre alguém melhor do que eu”. 

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Oriental, não de que país: “Os sábios não dizem o que sabem, os tolos não sabem o que dizem”. 

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Zulu: “Não se pode perseguir dois antílopes ao mesmo tempo”. 

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Africano, não sei de que país: “A paz é cara, mas vale a despesa”.

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Africano, também não sei de onde: “A união do rebanho obriga o leão a deitar-se com fome”. 

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Outro africano que não sei de onde: “Se quer ir rápido, vá sozinho. Se quer ir longe, vá em grupo”. 

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Camaronês: “Aquele que pergunta não pode escolher as respostas”. 

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Islâmico: “Humildade e cortesia são atos religiosos”. 

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Xintoísta: “O céu e o inferno provêm do mesmo coração”. 

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Judaico: “Não se aproxime de uma cabra pela frente, de um cavalo por trás ou de um idiota por qualquer dos lados”.

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Árabe: “Um beijo é uma guloseima que não engorda”.

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Árabe: “Não pressiones demais o covarde que ele vira valente”. 

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Árabe: “Conhecimento é uma riqueza que se pode transmitir sem se empobrecer”.

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Iraquiano: “Não declares que as estrelas estão mortas só porque o céu está nublado”.

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Austríaco: “A idade não protege da idiotice”.

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Sueco: “Se procuras uma mão disposta a te ajudar, tu a encontrarás no final do teu braço”.

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Sueco: “Procure me amar quando menos mereço, pois é quando mais preciso”.

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Congolês: “Os ausentes estão sempre errados”. 

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Marroquino: “Os anjos baixam suas asas para aquele que busca conhecimento”. 

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Marroquino: “Pouco e duradouro é melhor do que muito e passageiro”. 

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Curdo: “Enquanto não tiveres conhecido o inferno, o paraíso não será bom o bastante para ti”.

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Português: “Mineração e eleição, só depois da apuração”.

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Português: “Visitas sempre nos dão prazer. Se não quando chegam, pelo menos quando partem”.

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Português: “O homem é senhor do que pensa e escravo do que fala”. 

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Russo: “Os ricos teriam de comer dinheiro se, por sorte, os pobres não fornecessem a comida”.

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Russo: “O amor é mau – ele fará você se apaixonar por uma cabra”.

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Irlandês: “É melhor pagar o açougueiro que o médico”.

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Irlandês: “Cure o passado. Viva o presente. Sonhe o futuro”. 

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Hindu: “A árvore não prova a doçura dos próprios frutos; o rio não bebe suas próprias ondas; as nuvens não despejam água sobre si mesmas. A força dos bons deve ser usada para benefício de todos”. 

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Suíço: “Aos pobre falta muito, mas aos gananciosos falta ainda mais”. 

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Suíço: “Palavras são anãs, ações são gigantes”.

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Cheyenne: “Que os meus inimigos sejam fortes e corajosos, para que ao ser vencido não me sinta envergonhado”.

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Viking: “Rios de sangue não trazem paz, mas trazem obediência”.

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Viking: “Não olhe para trás, você não vai naquela direção”. 

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Alemão: “Todo amigo é o sol do outro; ele puxa, ele segue”.

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Queniano: “O valor da luz é percebido quando a noite cai”.

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Indonésio: “Não há melhor hora do que o presente”.

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Grego: “Muitas opiniões afundam o barco”. 

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Inglês: “Se não está errado, não conserte”.

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Filipino: “Qual a utilidade da grama quando o cavalo já está morto?”. 

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Argentino: “Quem se desenvolve é duas vezes nascido”.

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Indiano: “A vida é um eco. Se você não está gostando do que está recebendo, observe o que está emitindo”. 

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Aborígene australiano: “Mantenha seus olhos no sol e você não verá as sombras”.

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Maori: “Vire seu rosto para o sol e as sombras cairão atrás de você”.

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Angolano: “Se queres tirar algo no olho do outro, tira primeiro o que está no teu olho”.

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Quimbundo: “As escadas do mundo, uns sobem, outros descem”. 

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Inca: “Não sejas ladrão, não sejas mentiroso, não sejas preguiçoso”. 

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Asteca: “A terra será o que são seus homens”.

Navajo: “Você não pode acordar uma pessoa que está fingindo estar dormindo”. 

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Omaha: “É fácil ser corajoso a distância”.

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Apache: “É melhor ter menos trovões na boca e mais relâmpagos na mão”. 

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Mexicano: “Para cada um que madruga, há outro que não dorme”.

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Gaúcho: “Boi que atrasa bebe água suja”.

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Sírio: “Quem dorme no chão, não cai da cama”.

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Norueguês: “Antes livre em lugares desconhecidos que escravo em sua própria casa”.

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Libanês: “Quando o gato faz as pazes com o rato, quem sai perdendo é o dono do armazém”.

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Libanês: “Quem tem dinheiro, mesmo no inferno, pode tomar sorvete”.

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Cigano: “A Terra é meu lar, o céu é meu teto e a liberdade é a minha religião”.

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Tcheco: “Uma consciência culpada não necessita de acusador”.

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Filipino: “Qual a utilidade da grama se o cavalo já está morto?”. 

Termino com um mineiro, pensando no mau-caráter que sacaneia os outros: “Vingança é um prato que se come frio”. 


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Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em coautoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996), Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia) e Chegou a tua vez, moleque! (2021, Editora Limiar). Colabora com o Blog da Boitempo mensalmente.


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