Guia de leitura | Marx, esse desconhecido | ADC#33

Marx, esse desconhecido
Michael Löwy
Guia de leitura / Armas da crítica #33
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Em Marx: esse desconhecido, o cientista social Michael Löwy apresenta ao leitor facetas inusitadas, por vezes quase exóticas, do trabalho desse grande pensador alemão. Löwy expõe e comenta neste precioso livro pequenos brilhantes garimpados na monumental obra de Marx, capazes de surpreender mesmo os leitores mais aficionados, transitando por temas como suicídio, religião e até ecologia – uma área de estudo que só iria se consagrar por completo mais de cem anos depois.
A caixa ainda é acompanhada de um livreto com os artigos “Ecodecálogo” e “Da Revolução de Outubro ao ecocomunismo no século XXI”, de Michael Löwy, um conjunto de ímãs Léxico Marx, marcador e adesivo.
autor Michael Löwy
tradução Fabio Mascaro Querido
orelha Valerio Arcary
edição Frank de Oliveira
diagramação Antonio Kehl
capa Maikon Nery
coordenação de produção Livia Campos
páginas 184


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Quem é Michael Löwy?
Michael Löwy nasceu em São Paulo, em 1938. Estudou Ciências Sociais na USP e doutorou-se na Sorbonne com uma tese sobre o Jovem Marx orientada por Lucien Goldmann. Vive em Paris desde 1969, onde militou na Liga Comunista Revolucionária. Atualmente é diretor de pesquisas emérito no CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique).
Autor de várias obras, pela Boitempo publicou O caderno azul de Jenny: a visita de Marx à Comuna de Paris (com Olivier Besancenot, 2021), A estrela da manhã (2018), Centelhas (com Daniel Bensaïd, 2017), Revolta e melancolia (com Robert Sayre, 2015), A teoria da revolução no jovem Marx (2012), A jaula de aço: Max Weber e o marxismo weberiano (2014), Lucien Goldmann (com Sami Naïr, 2009), Revoluções (2009) e Walter Benjamin: aviso de incêndio (2005).
“Marx, esse desconhecido, de Michael Löwy, é uma delícia de livro. São raros aqueles que conseguem unir o rigor, o respeito e a inteligência de interpretações inusitadas com a força, a paixão e até a alegria da aposta revolucionária.”
VALERIO ARCARY


Desconhecido e imperdível
Se você quer saber o que Marx pensava sobre o sofrimento que levava mulheres de todas as classes sociais ao suicídio, assim como sobre o papel da tirania familiar do patriarcado que condiciona a opressão feminina, não pode deixar de ler este livro. Se quer uma avaliação crítica das reservas que Marx alimentava sobre a dialética do progresso, indo muito além de um entusiasmo ingênuo com o maquinismo, venha visitar estas páginas.
Se tem inquietação sobre o que Marx e Engels escreveram a respeito do sentido de arrebatamento que a religião despertou, vai se impressionar. Se está preocupado com o aquecimento global e os perigos catastróficos com que a crise ambiental nos desafia, encontrará referências na obra de Marx sobre ecologia e os limites da natureza.
Não fosse o bastante, você, leitor ou leitora, vai aqui encontrar também uma reflexão sobre o que Marx pensou sobre a Revolução Francesa, sobre as revoluções de 1848, sobre a primeira fórmula da revolução permanente… e muito mais.
Acredite, é imperdível.
Valerio Arcary
Historiador e autor de Ninguém disse que seria fácil (Boitempo, 2022).
“Este volume não tem a pretensão de reinventar a roda marxista: pretende apenas ser uma modesta contribuição à reflexão sobre a riqueza, a relevância e a atualidade do pensamento marxiano. Um pensamento que só será ‘superado’, como observou Rosa Luxemburgo, quando o capitalismo deixar de existir como sistema planetário de exploração, dominação e destruição.”
MICHAEL LÖWY


Marx e a opressão das mulheres
Entre os escritos de Marx, há um documento muito pouco conhecido; trata-se de “Peuchet: vom Selbstmord” [Peuchet: do suicídio], de 1846, peça composta de passagens traduzidas para o alemão de Du suicide et des ses causes [Do suicídio e de suas causas], um capítulo das memórias de Jacques Peuchet. […]
Quem são as vítimas não proletárias levadas ao desespero e ao suicídio pela sociedade burguesa? Há um setor social que toma um lugar central tanto nos excertos de Peuchet como nos comentários de Marx: as mulheres. Com efeito, esse texto de Marx é uma das mais poderosas peças de acusação à opressão contra as mulheres já publicadas. Três dos quatro casos de suicídio mencionados nos excertos se referem a mulheres vítimas do patriarcado ou, nas palavras de Peuchet/Marx, da tirania familiar, uma forma de poder arbitrário que não foi derrubada pela Revolução Francesa. Entre elas, duas são mulheres “burguesas”, e a outra, de origem popular, filha de um alfaiate. Mas o destino delas fora selado mais pelo seu gênero que por sua classe social.
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 17-20]
“O ensaio de Marx/Peuchet constitui um protesto apaixonado contra o patriarcado, a sujeição das mulheres e a natureza opressiva da família burguesa. Com raras exceções, não há nada comparável nos escritos posteriores de Marx.“
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 46]


Marx, Engels e a religião
Muito já se escreveu sobre a crítica marxista da alienação religiosa ou sobre a luta do ateísmo materialista contra o idealismo cristão. Mas o que nos interessa neste texto é a contribuição de Marx e Engels para a sociologia dos fatos religiosos. Uma excursão atenta nesse campo pode nos surpreender. […]
Herdeiros do hegelianismo de esquerda e do iluminismo, Marx e Engels criariam por sua vez um modo de análise da religião, baseado no estudo dos vínculos entre alterações econômicas, conflitos de classe e transformações religiosas. Apesar de nem sempre evitarem o reducionismo, eles abriram um campo de pesquisa que se mantém até hoje no centro da sociologia das religiões.
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 33-46]
“A questão ecológica é, na minha visão, a questão social e política central do século XXI, e portanto o grande desafio para uma renovação do pensamento marxista em nosso tempo.”
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 62]


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A ecologia
É inegável que Marx e Engels se interessaram pelos problemas ambientais de sua época, criticando os danos causados pelo modo de produção capitalista. Podemos então conceber uma leitura ecológica de Marx? Quais são as aquisições do marxismo indispensáveis à constituição de um ecossocialismo à altura dos desafios do século XXI? E quais são as concepções de Marx que requerem uma “revisão” em função dessas exigências?
As breves notas que se seguem não têm a pretensão de responder a essas questões, mas somente de colocar algumas balizas para o debate. Meu ponto de partida é a constatação de que: a) os temas ecológicos não ocupam um lugar central no dispositivo teórico marxiano; b) os escritos de Marx e Engels sobre a relação entre as sociedades humanas e a natureza estão longe de serem unívocos, e podem, portanto, ser objeto de interpretações diferentes.
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 47]
“O ecossocialismo implica uma radicalização da ruptura com a civilização material capitalista. Nessa perspectiva, o projeto socialista visa não apenas uma nova sociedade e um novo modo de produção, mas também um novo paradigma de civilização.”
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 63]


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Comunistas românticos?
Habitualmente, são mencionadas como principais fontes do comunismo de Marx (e de Engels) o socialismo francês, a filosofia alemã e a economia política inglesa. Gostaria de acrescentar outra, tão importante quanto essas três últimas e que contribuiu para moldar sua crítica ao capitalismo e sua visão de uma sociedade emancipada: o romantismo.
Nas páginas a seguir, examinarei essas fontes românticas e mostrarei como os escritos de Marx e Engels carregam uma dimensão romântica significativa. Meu argumento não é que Marx e Engels foram pensadores românticos, mas sim que existem afinidades substanciais – muitas vezes negligenciadas – entre o marxismo e o romantismo.
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 65]
“Os marxistas de nossa época devem seguir o exemplo de Karl Marx e Friedrich Engels: reagir, utilizando o método dialético, aos novos problemas colocados pela mudança histórica.”
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 64]


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A revolução permanente
Pode-se encontrar igualmente nos escritos de Marx e Engels a ideia de revolução permanente: ou seja, a hipótese de um processo revolucionário ininterrupto, definido por um transcrescimento da revolução democrática em socialista, mesmo em países periféricos e semifeudais da Europa. […]
Marx e Engels admitiam a possibilidade objetiva de uma ruptura na sucessão das tarefas históricas, que essas tarefas – democráticas, antiabsolutistas, agrárias, socialistas – envolvem uma articulação complexa, dialética, e que o materialismo histórico não pode ser reduzido a um evolucionismo unilinear, economicista ou metafísico. Esses textos sugerem, portanto, ainda que de maneira pouco desenvolvida, uma perspectiva aberta, que reconhece uma multiplicidade de formas de transformação histórica e, sobretudo, a possibilidade de que as revoluções sociais modernas comecem na periferia do sistema capitalista, e não, como pode ser encontrado em alguns de seus escritos, no centro (Inglaterra!). Trata-se de uma démarche teórica, política e estratégica que antecipa, de modo surpreendente, os movimentos revolucionários do século XX.
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 123-124]
“Marx e Engels não sonhavam com um retorno ao passado – uma típica atitude romântica reacionária –, mas com um desvio pelo passado em direção a um futuro comunista: um futuro que abriria um campo ilimitado para o desenvolvimento e o enriquecimento da vida humana.“
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 84]


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A atualidade do Manifesto comunista
O que permanece do Manifesto 150 anos depois? Algumas passagens ou alguns argumentos já tinham se tornado obsoletos durante a vida de seus autores, como eles mesmos reconheceram em seus numerosos prefácios. Outros se tornaram no curso de nosso século e exigem um reexame crítico. Mas o propósito geral do documento, seu núcleo central, seu espírito – existe algo como o “espírito” de um texto – não perdeu nada de sua força e de sua vitalidade.
Esse espírito resulta de sua qualidade ao mesmo tempo crítica e emancipadora, isto é, da unidade indissolúvel entre a análise do capitalismo e o chamado à sua destruição, entre o exame lúcido das contradições da sociedade burguesa e a utopia revolucionária de uma sociedade solidária e igualitária, entre a explicação realista dos mecanismos de expansão capitalista e a exigência ética de “suprimir todas as condições no seio das quais o homem é um ser diminuído, sujeitado, abandonado, desprezado”. De muitos pontos de vista, o Manifesto é não somente atual, mas mais atual hoje do que há 150 anos.
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 145-146]
“Da convergência entre a renovação da tradição socialista, anticapitalista e anti-imperialista, do internacionalismo proletário – fundado por Marx no Manifesto comunista – e das aspirações universalistas, humanistas, libertárias, ecológicas, feministas e democráticas dos novos movimentos sociais é que poderá surgir o internacionalismo do século XXI.”
[MARX, ESSE DESCONHECIDO, p. 155]


Leituras complementares
Baixe os conteúdos complementares do mês em PDF!
Este mês trazemos um capítulo de Marx nas margens, de Kevin B. Anderson, outro de O velho Marx, de Marcello Musto e o prefácio de Sabrina Fernandes para O ecossocialismo de Karl Marx, de Kohei Saito.
Clique nos botões vermelhos abaixo para fazer o download!
Kevin B. Anderson
Escritos tardios sobre sociedades não ocidentais e pré-capitalistas
Marcello Musto
A última viagem do Mouro
Sabrina Fernandes
Prefácio

Vídeos
Este mês trazemos o lançamento antecipado do livro com Fabio Mascaro Querido e Valerio Arcary, além de um vídeo com Michael Löwy comentando os principais aspectos da obra e outro em defesa do ecossocialismo.

Para aprofundar…
Compilação de textos, podcasts e vídeos que dialogam com a obra do mês.

Marx nas margens, de Kevin B. Anderson
Karl Marx: uma biografia, de José Paulo Netto
O velho Marx, de Marcello Musto
O ecossocialismo de Karl Marx, de Kohei Saito
O caderno azul de Jenny: a visita de Marx à Comuna de Paris, de Michael Löwy e Olivier Besancenot
A jaula de aço: Max Weber e o marxismo weberiano, de Michael Löwy
A teoria da revolução no jovem Marx, de Michael Löwy
Walter Benjamin: aviso de incêndio, de Michael Löwy
Lucien Goldmann, de Michael Löwy e Sami Naïr
Revoluções, de Michael Löwy

Cofeee with comrades: #188: The future is black and red, com Michael Löwy e David Campsbell [em inglês], mar. 2023.
20 minutos: Capitalismo verde ou ecossocialismo?, com Michael Löwy, dez. 2022.
Escuela de cuadros: La teoria da revolución en el joven Marx [em espanhol], com Michael Löwy, jan. 2022.
Expressão Popular: Programa Batalha das ideias | Comuna de Paris, com Michael Löwy e Virgínia Fontes, maio 2021.
Jones Manoel: Biblioteca crítica #6 | O marxismo latino-americano: Agustín Cueva versus Michael Löwy, com Jones Manoel, nov. 2021.
Comunacast: #4 | Do caos à lama: a IV Internacional e o ecossocialismo, com Michael Löwy, maio 2020.

Introdução a Michael Löwy, com Fabio Mascaro Querido, TV Boitempo.
A questão política decisiva do século XXI, com Michael Löwy, TV Boitempo.
Revolução Russa e a questão nacional, com Michael Löwy, Ruy Braga e Isabel Loureiro, TV Boitempo.
Ecocomunismo e revolução, com Michael Löwy, TV Boitempo.
Marxismo e surrealismo, uma combinação revolucionária, com Michael Löwy, TV Boitempo.
As fontes românticas do marxismo, com Michael Löwy, TV Boitempo.
Um Marx do ponto de vista da periferia, com Michael Löwy, TV Boitempo.
O que pensava Marx sobre raça, gênero e colonialismo?, com Michael Löwy e Jones Manoel

“Karl Marx, esse desconhecido imperdível“, por Valerio Arcary, Blog da Boitempo, 2023.
“O marxismo surrealista de Michael Löwy“, por Roberto Schwarz, Blog da Boitempo, 2018.
“Rosa Luxemburgo e Marielle Franco foram assassinadas porque incomodavam”, por Michael Löwy, Blog da Boitempo, 2019.
“Crise climática e alienação“, por Michael Löwy, A Terra é redonda, 2023.
“Marxismos e cristianismos“, por Michael Löwy, A Terra é redonda, 2022.
“Do partido único ao stalinismo“, por Michael Löwy, A Terra é redonda, 2021.
“Treze teses sobre a catástrofe ecológica iminente“, por Michael Löwy, A Terra é redonda, 2020.
A edição de conteúdo deste guia é de Isabella Meucci e as artes são de Victoria Lobo.


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